NÚCLEO DE MEDITAÇÃO
ARTIGOS - TEXTOS E AFINS
A não distração na prática da meditação
Na meditação quando o sono e o torpor surgem, eles estão associados a corrente contínua de pensamentos do praticante. Essa corrente contínua leva a mente para um estado de obscurecimento e perda de clareza. São como nuvens cobrindo a claridade e a luminosidade de um céu claro. Também significa que o praticante não está atento, e divaga de um pensamento ao outro, até que se perde entre eles, sendo levado para todos os lugares, e nunca permanece no lugar que deseja estar. A clareza da mente desperta é isenta de foco. Ela está focada em nenhuma coisa, em nenhum objeto, em nenhum pensamento. É pura lucidez sem objeto, é claridade em contraposição ao obscurecimento. O importante na clareza é que não nos distraímos e não restringimos a percepção sob um foco, mas mantemos uma constância de atenção no presente. Constante aqui é o estado de não distração. O movimento da mente em direção as coisas pode ser qualificado como o próprio estado de obscurecimento da lucidez. Quando a mente não está se dirigindo para nenhum lugar e ao mesmo tempo não se encontra distraída, ela repousa lúcida e presente. A ausência de movimentos é a experiência da lucidez da mente: você simplesmente está aí vendo, acordado, lúcido. Tudo o que surge não se fixa, não permanece, simplesmente se auto-libera, se desprende de si mesmo. Exatamente porque não existe apego na mente enquanto lúcida e não distraída. O sono e o torpor estão associados a um estado hipnótico produzido pelo movimento da mente. As coisas estão se movendo naturalmente ao seu redor, dentro e fora da sua mente, mas você resolve segui-las. Esse seguir é semelhante ao hipnotizado seguindo as ordens do hipnotizador. Você erra com seus pensamentos por um labirinto, e o constante estímulo faz você ficar amortecido, insensível. Quanto mais você busca mais certo é que você não encontre, pois como você pode encontrar uma coisa que não se separou de você? O que você busca é uma outra coisa que não esse instante vivo e desperto que existe com você. Você busca uma imagem disso, uma imagem representativa do que você chama felicidade, silêncio, paz, meditação. Toda essa noção nos diz por que não é possível praticar o estado de lucidez e plena atenção. A lucidez e a plena atenção são a própria clareza e precisão do presente. Exatamente por isso você não consegue praticá-la. Estar presente ou no presente é estar lúcido. A prática termina quando você está aí. E ocorre que você não sai daí. Podemos dizer que você esquece que está aí quando se distraí. Quando pratica isso quer dizer que você está tentando ficar presente, mas se você está presente já estará nessa lucidez, nessa atenção. Você se distrai e logo saí do presente imediato, quando se dá conta dele e nele permanece está lúcido, atento. Por isso o erro na prática é o esforço excessivo que produz a dualidade, a separação com o presente. Quando você consegue manter o estado de não distração, então se encontra lúcido, como se não existisse outra coisa se não estar lúcido, presente. Então pratique estar no estado de não distração. Você pode praticar shamatha (meditação de calma e estabilidade), não como alguém luta para estar presente na respiração, mas como alguém que já vê a respiração todo o tempo, pois ela não se ausenta. Então estará praticando o estado de não distração, que é um nível mais sofisticado e preciso de shamatha. Existe como sabem três tipos da prática com shamatha. Um com objeto externo – focalizando a atenção na respiração, em um ponto, em uma estátua. Outro com objeto interno que está ligado as visualizações internas, da criação de imagens para focar a atenção. Por fim o shamatha sem objeto que é repousar a atenção no presente de forma relaxada, no estado natural da mente, sem objeto específico. Se diz repousar no estado natural da mente, pois como me referi sobre o momento presente e a lucidez, o estado natural é o estado de lucidez. Uma vez que intuitivamente você vê ou compreende isso, sua prática muda do esforço excessivo, do apego a conseguir algo com a meditação, para o não-agir, não-reagir, que é o mesmo que não fazer esforços para se manter no estado de lucidez clara e imediata.
SÉRGIO VELEDA
01.11.2010